Jacobus van Wilpe (Haia, 1905, Ponta Grossa, 1986) – Pintor dos Campos Gerais
Jacobus van Wilpe, óleo sobre tela de Kurt Boiger, data ignorada.
Por Renato van Wilpe Bach
Os van Wilpe eram açougueiros em Haia desde o século XVIII, comprovam os documentos holandeses, digitalizados e disponíveis para o público pela internetja há alguns anos. Eram pequenos burgueses, em uma Haia em constante expansão, enriquecimento e desenvolvimento tecnológico. Quando vieram ao Brasil, em 1920, Jan Hendrik van Wilpe e Helena Kranendonk deixaram para trás o sobrado onde tinham seu negócio, embaixo, e residiam, em cima, na Frederikstraat, uma rua importante do centro da cidade, e tinham luz elétrica, água encanada, telefone e bonde na porta, boas escolas públicas e muitos parques e museus.
A Grande Guerra, como foi chamada antes que se soubesse de uma Segunda, contudo, deixou a família empobrecida; com seis filhos para criar, Jan Hendrik temia pelo futuro dos seus. Sob a influência dos primos De Geus, que haviam imigrado alguns anos antes, decidem partir para o Brasil, especificamente para Carambehy, no Estado do Paraná, onde aqueles estavam estabelecidos.
Diferentemente das outras famílias pioneiras da Colônia, os van Wilpe não tinham experiência com agricultura ou pecuária, apenas com comércio, e sofreram muitos reveses em seus primeiros anos por aqui. As dificuldades de adaptação ao novo negócio, somaram-se incêndios acidentais em duas ocasiões, forçando a família a sempre recomeçar.
Jacobus era o segundo filho, e enquanto o primogênito Hermen ajudava os pais na chácara, teve que ir buscar a própria sobrevivência. Fora Hermen, era o único em idade para trabalhar.
Chegou ao Brasil com 15 anos de idade, e fez de tudo um pouco: foi lavrador, lenhador, ferroviário, mecânico, serralheiro e pecuarista de leite. Trabalhou no matadouro de gado e como charqueador, ajudou a abrir a (assim chamada) Estrada Velha de Carambeí (a primeira a encurtar a distância até Ponta Grossa). Em Castro, trabalhou como mecânico com o amigo Daan Los e o cunhado Leonardo de Geus; de volta a Carambeí foi sócio em duas serrarias, com os citados Leen e outro cunhado, Oswin Schwarz.
Em Haia, quando menino, Jacobus sonhava em ser artista, “pintor e jornalista”, como conta em seu livro, mas a imigração alteraria toda sua trajetória. Em Castro, já mais estabilizado financeiramente, volta a desenhar e pintar, trocando a feitura de cartazes para o cinema e o circo por bilhetes.
Paisagem, óleo sobre compensado de Jacobus van Wilpe, 1959.
Paisagem, óleo sobre compensado de Jacobus van Wilpe, 1980.
Acácia Mimosa, óleo sobre tela de Jacobus van Wilpe, 1961.
Durante breve temporada em Curitiba em 1935, a convite do cunhado (e artista) Kurt Boiger, casado com Helena, conhece a turma de pintores da capital que seriam seus amigos por décadas: Waldemar Curt Freyesleben, Estanislau Traple, Arthur Nisio, e aquele que seria seu único professor de desenho na vida o genial, excêntrico artista e criterioso cientista, esta figura definidor do Paranismo, Frederico Lange de Morretes.
Sua mãe Helena Geertruida Kranendonk van Wilpe teve papel fundamental, tanto na carreira de Ko, quanto na de seus amigos, tendo sido retratada um sem número de vezes por Boiger, Freyes e Traple, quanto por alunos da Escola de Música e Belas Artes do Paraná. Um retrato seu, pelo professor Freyesleben, esteve exposto por décadas no saguão do prédio histórico hoje em recuperação.
Em 1946, Jacobus compra a Chácara Pitangui, nos arredores de Ponta Grossa, cidade onde residiu pelo próximos quarenta anos de sua vida. É para lá que acorrem os amigos artistas, Boiger e Freyesleben mais assiduamente, para pintar retratos e naturezas-mortas, pescar, debater Arte e Filosofia, pintar as curvas do Rio Pitangui, que corria em suas terras, em temporadas que se estendiam por semanas. Apesar da rotina dura de chacareiro e pecuarista, Jacobus nunca pararia de pintar seus quadros.
Expõe em Curitiba ainda em 1942, e nos famosos Salões da Primavera do Club Concórdia ao longo das de décadas de 1950-60. Em Ponta Grossa nos anos 1980, após a venda da propriedade e a mudança com sua esposa Ilse para a cidade, volta a expor em coletivas, aproximando-se assim das novas gerações de artistas da cidade.
Durante sua “aposentadoria”, Jacobus, além de pintar, escreveu suas memórias, depois publicadas em pequena tiragem na Holanda, após criteriosas revisões transatlânticas com o primo Hermen Kranendonk, cuja primeira edição em português está sendo preparada para publicação em breve. Partes de seus escritos foram publicados no jornal da Batavo nos anos 1980, e dois capítulos foram incluídos no livro (de Hendrik Adriana Kooy) “Carambeí 75 anos – 1911-1986”. Ambos os livros foram lançados após a morte de Ko, que hoje repousa no cemitério dos pioneiros em Carambeí.
Jacobus nunca fez uma exposição individual durante sua vida, por não querer comercializar seus quadros. Preferia guardá-los até aparecer a oportunidade de presentear um bom amigo, um parente de aniversário, um casal em seu enlace. Suas obras, assim, estão hoje dispersas em acervos particulares e familiares. Duas mostras individuais, póstumas, foram realizadas, em 1986 e 2002.
A presente exposição em cartaz no PROEX/UEPG (Praça Marechal Floriano, 129, Centro, Ponta Grossa), com curadoria das professoras Adriana Suarez e Sandra Borsoi, reúne quadros de várias fases do pintor, com ênfase nas paisagens, e retratos de Boiger, Freyesleben e do próprio autor. A mostra permanece aberta até 13/10/2022, de segunda a sexta-feira, e faz parte das comemorações de abertura do ano do bicentenário da cidade de Ponta Grossa (#pg200anos).
Autorizado pelo autor para publicação e divulgação.
Artigo publicado pela ACBH na revista De Regenboog nº 282 setembro 2022.
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