A Casa de Maurício I Het Mauritshuis (4)
João Maurício estava presente no casamento de Louise Henriette, filha de Frederik Hendrik e Amalia van Solms, com o Grande Eleitor de Brandenburgo, Friedrich Wilhelm. João Maurício e Friedrich Wilhelm já se conheciam desde a tomada do Schenkenschans. A partir da cidade de Cleves, Friedrich Wilhelm reinava sobre mais seis cidades. Ele enfrentava muitos problemas com a nobreza da região e as cidades. A nobreza não queria desistir dos privilégios do passado e as cidades se queixavam dos altos impostos. João Maurício foi convidado a intermediar e, em 1648, se mudou para Cleves, onde comprou alguns lotes de terra para construir sua nova residência. Trocando uma parte da sua coleção brasiliana, conseguiu adquirir mais terras, onde fez construir os famosos Jardins de Cleves.
O imperador Ferdinando II promoveu João Maurício a príncipe em 1652; ele também foi eleito grão mestre na Ordem dos Johanniter. Esporadicamente João Maurício ocupava seu palacete em Haia.
Os problemas de Wilhelm Friedrich com a nobreza e as cidades somente foram resolvidos em 1660. Entre 1658 e 1665, João Maurício viajava muito entre Haia, Berlim, Londres e as regiões de Cleves. Em 1668, foi nomeado marechal de campo do exército holandês, diante das ameaças da França. No ano de 1672, França, Inglaterra, Münster e Colônia declararam a guerra à Holanda. Nesta época, a saúde de João Maurício começou a piorar: pedras nos rins e bexiga, e também gota. A maior parte do ano de 1675 ele permaneceu na Mauritshuis, mas os últimos anos de sua vida foram passados em Berg und Tal, perto de cidade de Cleves onde morreu em 1679.
João Maurício nunca soube viver de maneira modesta. Onde quer que ele se instalasse, logo começava a construir, fazer jardins, contratar artistas e impulsionar a vida cultural. Consequência: a Mauritshuis ficou com uma hipoteca de 130.000 florins e, após a morte de João Maurício, caiu em 1683 nas mãos do maior credor, Gerrit Maes e sua mulher. O casal alugava a casa às autoridades e, após a morte deles, a casa ficou com os seus herdeiros.
A casa continuava sendo alugada para que as autoridades holandesas pudessem hospedar ministros estrangeiros e embaixadores num lugar imponente.
João Maurício de Nassau-Siegen como governador de Cleves.
Gravura anônima do Atlas van Stolk
Moça com brinco de pérola de Johannes Vermeer (1632-1665)
A partir de 1701, o inquilino da Casa de Maurício era John Churchill, duque de Marlborough. Na manhã do dia 22 de dezembro de 1704 ele partiu para Inglaterra para, provavelmente, celebrar o Natal no seu próprio país. O secretário dele, Watkins, acompanhou seu patrão até o embarque e iria voltar para a Mauritshuis no dia seguinte. O empregado do secretário, Willem Wolf, desejava um ambiente aquecido, pois fazia um frio de rachar naquele dia. Pela demora do secretário, Wolf se retirou e foi dormir numa hospedaria. Menos de uma hora depois, o incêndio foi descoberto. Tudo indicava que Wolf tinha sido o responsável por descuido ou negligência. Não foi no dormitório de Watkins que o fogo começou, mas no quarto vizinho, onde Wolf tinha esquecido de apagar uma vela. Neste quarto havia garrafas com bebidas, cobertas por feno. O assoalho deste quarto já tinha cedido em parte e garrafas caíram no andar de baixo. Mesmo neste estágio, ainda teria sido possível apagar as chamas, mas ninguém obedeceu a orientação do mordomo para buscar água. Todos começaram a retirar os móveis e o fogo prosperava. O incêndio foi tão devastador que o palacete queimou até os porões. Nunca vamos saber quantos móveis se perderam neste incêndio. Temos apenas certeza que os afrescos, pinturas nas paredes, se foram para sempre.
Em 1706, foi resolvido reconstruir o palacete com dinheiro obtido através de loterias. O dinheiro não foi suficiente e o governo usou os aluguéis devidos à família Maes para terminar a obra! Apesar da disponibilidade dos projetos originais, a Mauritshuis sofreu muitas modificações.
Os herdeiros Maes colocaram o palacete à venda e, em 1820, foi adquirido por 35.000 florins pelo governo holandês. Logo foi usado para abrigar o Gabinete Real de Quadros e o Gabinete Real de Raridades. Este último sofreu pesadas críticas pela confusão das peças expostas e mudou para Amsterdã. O museu foi oficialmente inaugurado em 1822* e podia ser visitado “por todos que estão bem vestidos e desacompanhados de crianças.”
A Mauritshuis foi submetida a inúmeras reformas e restaurações até o dia de hoje e tornou-se um dos museus mais visitados da Holanda.
Para conhecer seu interior e seu conteúdo, basta acessar o site da Mauritshuis. Um dos quadros mais famosos do museu, sem dúvida, é a ‘Moça com Brinco de Pérolas’, popularmente também conhecido como ‘Mona Lisa do Norte’ ou ‘Mona Lisa holandesa’.
Historiadores afirmam que a tinta azul usada no quadro (1665) era mais cara do que ouro. O quadro andou desaparecido durante quase dois séculos e reapareceu em um leilão, em 1881, quando foi comprado por dois florins e trinta centavos! Em 1902, o comprador, que não deixou herdeiros, doou o quadro ao museu. O quadro foi e continua sendo objeto de estudos cada vez mais aperfeiçoados.
A escritora Tracy Chevalier escreveu, em 1999, o livro de ficção ‘Girl with a Pearl Earring** e a partir deste livro foi feito um filme onde a moça Griet foi interpretada pela atriz Scarlett Johansson.
A foto do busto de João Maurício retrata apenas uma réplica do busto. O busto original havia sido confeccionado para enfeitar o jardim da Mauritshuis. Em 1669, por ordem do conde, o busto foi transferido para Siegen, onde está até o dia de hoje na Fürstengrube, jazigo dos nobres da família Nassau.
Uma réplica foi feita e ornamentava a entrada do museu Mauritshuis. Hoje a réplica se encontra no depósito do museu, atendendo aos clamores de várias entidades e pessoas que não se conformam com o papel exercido por João Maurício no tráfego de escravos da África para América Latina, inclusive Brasil.
*Neste ano de 2022 se comemora o bicentenário da inauguração com muitas exposições, atividades etc. Consulte o site Mauritshuis.
** O livro foi traduzido para o português em 2004 pela editora Bertrand
Obras consultadas para os textos sobre a Mauritshuis:
Soweit der Erdkreis reicht: vários autores
Mauritshuis: Evelyn de Regt
Wikipedia
Este artigo foi escrito por Johan Scheffer e publicado pela ACBH na revista De Regenboog nº 280 junho 2022.
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Busto de João Maurício de Nassau-Siegen, obra de Bartholomeus Eggers (1632-1692)
