Monte Alegre
Lembranças de um imigrante
Relato sobre a colônia Monte Alegre a partir da sua formação em 1949 pelos imigrantes holandeses. Em 1963 a família Cnossen veio do sul da província Drenthe na Holanda para se instalar na colônia Monte Alegre no Brasil. Siebren Cnossen colabora com lembranças e imagens deste período da história de sua família.
A colônia de Monte Alegre
A colônia teve seu início no município de Tibagi, que posteriormente, em 1964 foi desmembrado criando o atual município de Telêmaco Borba. A sua formação foi pelo grupo Klabin que no início teve interesse nos produtos lácteos para abastecer os seus 12.000 operários do setor industrial e florestal. Os primeiros contatos foram entre a Indústria Klabin do Paraná de Cellulose S/A. e o grupo de pioneiros dos colonos através das representações diplomáticas. Jacob Voorsluys de Carambeí e o pastor William Vincent Muller, junto com o grupo Klabin tiveram o contato em 1949 com a associação de colonização Schildwolde – Hoogkerk e outros na Holanda. Um grupo que tinha se separado da Igreja Reformada da Holanda e preferiu um isolamento rigoroso em relação aos membros de outros credos. Desta Sociedade de Emigração de orientação religiosa vieram em 1949, como grupo pioneiro, cinco famílias e dois solteiros para Monte Alegre.
A colônia ficava no Segundo Planalto do Paraná, cerca de 750 metros acima do nível do mar. O relevo em Monte Alegre era mais ondulado do que em Castrolanda e Carambeí, com cerca de 70% das terras mecanizados e o solo com maior fertilidade natural do que nas duas outras colônias Carambeí e Castrolanda.
Mapa da colônia Monte Alegre no interior do Paraná
Willy Wever arando com cavalo
Família Martin Bos em sua oficina de bicicletas em Monte Alegre
Vista da Chácara da família Malestein
Os critérios para a escolha dos colonos
– Pertencer ao grupo dissidente da Igreja Reformada da Holanda.
– Dispor de um capital de 30.000,00 florins.
Não era condição indispensável ser agricultor, porem a maioria dos colonos era de origem agrícola.
O que o grupo Klabin cedeu à disposição das famílias de imigrantes
– Inicialmente cerca de 30 alqueires paulistas (73 hectares) arrendados por família, com contratos para vinte anos.
– Casa de residência.
– Gado
– Um trator para as primeiras cinco famílias.
– Fornecimento gratuito de energia elétrica para o centro da colônia e posteriormente para a fábrica de laticínios.
– Despesa de viagem terrestre do porto de desembarque até a colônia.
– Financiamento de custos de vida para inicialmente os primeiros dez meses, prazo este, que foi prorrogado posteriormente para 18 meses.
– O órgão colonizador construiu e instalou a fábrica de laticínios em 1958.
Os contratos de arrendamento foram feitos individualmente entre cada colono e o grupo industrial. Porém, só os primeiros colonos receberam um contrato por escrito, enquanto os contratos posteriores apenas foram averbados. O preço do arrendamento era quase só simbólico e não onerava em demasia o custo da produção. O sistema funcionou durante quase 20 anos, prova que os dois lados cumpriram seus compromissos verbais satisfatoriamente.
Os contratos estabeleceram que os colonos deveriam dar preferência, para a venda de seus produtos, às organizações do grupo Klabin, enquanto havia igualdade de condições com os mercados externos. Este princípio foi abolido posteriormente em relação aos produtos lácteos.
Igreja da colônia Monte Alegre
Batismo Infantil na igreja de Monte Alegre
Chegada de mais colonos a Monte Alegre
Depois do estabelecimento do primeiro grupo, passaram-se quatro anos até a chegada de mais colonos da Holanda, que até o ano de 1954, somaram um total de 26 famílias ou cerca de 100 pessoas como ponto máximo de agrupamento. Posteriormente, não houve mais aumento do número de colonos; havia, porém, remigração de algumas famílias para a Holanda, e na mesma medida, chegada de outros agricultores do mesmo credo, que ficaram no lugar dos remigrantes. Com a melhoria da situação econômica na Europa, que se fez sentir a partir de 1950, desvaneceu-se o grande interesse na emigração e no caso especial, o entusiasmo missionário que animou os pioneiros do grupo de Monte Alegre.
Com a construção da fábrica de laticínios em 1958 pelo órgão colonizador, os colonos de Monte Alegre levaram uma certa desvantagem em comparação às outras colônias holandesas, recebendo um preço inferior para sua produção animal. Os preços de venda de leite foram estipulados em combinação com a indústria Klabin que sempre defendeu o interesse do seu operariado, insistindo então em pagamentos inferiores. Assim receberam por exemplo em 1962, para o leite, apenas 70% do valor pago em Castrolanda.
Família Cnossen (da esquerda para a direita): Siebren, Gerrit, Yke, Wessel com Anna, Antiena (Mama), Jentje (Hait) e Sipke. Na fileira da frente (pequenos): Wiebe, Aaltje com Grietje, Jentje, Albert e Antiena.
Premiação em dia de exposição de gado, 1965 – Pessoas identificadas, da esquerda para a direita: Hendrik Kooy, Piet Timmerman, Jan Glas, Jebbe Sikkema, Hendrik Jan Buitenhuis (ao lado da vaca) e o casal Groenveld, sentado.
Dia da Rainha em Monte Alegre
Um grande evento na colônia foi a visita do Príncipe Bernhard no dia 22 de outubro de 1959, que aconteceu no período do pastor Dirk Los que residiu na colônia no ano de 1956 até 1965. Com muito entusiasmo o Príncipe Bernhard foi recebido. A esposa do pastor D. Los, Hendrika Theodora Los – Van der Hoogt preparou para aquele dia uma refeição especial na sala pastoral. Uma tarefa para o Príncipe foi inaugurar a fábrica de laticínios.
Imigrantes holandeses
Em 1963 chegou a família Jentje Cnossen, sua esposa Antina Koeling e seus onze filhos, vindo da região de Dedemsvaart – Holanda para a colônia de Monte Alegre – Paraná. O casal teve mais quatro filhos no Brasil, num total de quinze. A família Cnossen ficou de sete a oito anos na colônia de Monte Alegre.
Príncipe Bernhard descerrando a fita de inauguração da Fabrica de Laticínios em 1959
Fábrica de laticínios em Monte Alegre
Festa na colônia com brincadeira tradicional holandesa de pescar bolo
Produção de leite
Só em 1965 foi estabelecida a “Cooperativa Holandesa Monte Alegre Ltda”, que posteriormente se chamou “Cooperativa de Laticínios Monte Alegre Ltda”. O nível econômico alcançado dos colonos é comparável às demais colônias holandesas. A maioria dos agricultores possuíam trator com os respectivos implementos e jipes ou camionetes. Uma grande desvantagem foi a falta de energia elétrica, a não ser por fonte própria. No centro da colônia tinha a fábrica, igreja e casa pastoral que possuíam luz elétrica. Apesar do aparente sucesso econômico e das ajudas recebidas, a colônia de Monte Alegre seria extinta em breve. Nos últimos anos o número de famílias já havia diminuído para 16 agricultores e mais três não agricultores e a produção leiteira baixou de 1123 toneladas em 1966 para 885 toneladas em 1969.
Os motivos para a dissolução da colônia Monte Alegre são os seguintes:
– A esperança inicial de criar-se o reerguimento da economia europeia. As famílias pioneiras ficaram sem seguidores a partir de 1955. Desta forma, o grupo ficou pequeno e por suas peculiaridades religiosas isolaram-se cultural e socialmente por completo, nem procurando contatos correspondentes com os outros núcleos holandeses. O receio passou a ser um problema para a nova geração, com casamento entre parentes e os perigos relativos ao parentesco, que seria inevitável no futuro do pequeno grupo por falta de possibilidades de escolha. Assim decidiram voltar para a Holanda ou fixar-se nos EUA, Canadá, África do Sul, em contato com grupos maiores do seu mesmo credo.
– Os contratos primários se esgotaram e o grupo Klabin não os queria prolongar para períodos mais longos do que cinco anos, aumentando ao mesmo tempo o preço de arrendamento a 32% do salário mínimo por hectare (80% por alqueire paulista). O fato de viverem e trabalharem em terras alugadas em vez de terras próprias não criou, naturalmente, os laços estreitos que normalmente ligam o agricultor a sua propriedade.
– Naturalmente, a nova geração já nascida no Brasil ou imigrada ainda criança está saindo, aos poucos, do isolamento intelectual. Sendo menos onerados por preconceitos, os jovens aceitam seu novo mundo com mais naturalidade e facilidade. O ensino primário, dentro do programa oficial do país favorece a integração, sem prejudicar as características originais, possibilitando, inclusive, o ensino da língua holandesa em aulas facultativas.
Lembranças da colônia
Várias famílias saíram da colônia e ficaram no Brasil, Jentje Cnossen, pai de Siebren, foi à procura de terras e achou em 1983 Brasolândia, na região de Unaí – MG, onde hoje moram cerca de 20 famílias holandesas, e outros foram para Castrolanda e Carambeí. Duas famílias, sendo Jentje e Antina Cnossen e Willy e Martje Wever, foram para o projeto Núcleo Leiteiro da Lapa – Paraná. Um dos filhos da família Cnossen, sendo Siebren, atualmente é agricultor e casou-se com Gertrud Dück, a filha de seu vizinho; eles têm quatro filhos e cinco netos.
Siebren menciona que visitou a região de Monte Alegre várias vezes, onde ainda encontrou algumas lembranças de antigamente no meio do reflorestamento da Klabin, como um pedaço de concreto do degrau da entrada da Igreja e alguns sinais de diversas chácaras. No antigo cemitério de Harmonia, que hoje está abandonado, sabemos que tem três pessoas holandesas sepultadas.
As únicas lembranças da colônia que ficaram são as diversas histórias dos próprios colonos que ainda vivem e as fotos que dão uma ideia como era o cotidiano de trabalho e os momentos de lazer e festividades.
Artigo escrito por Ruth e Willem Kiewiet, com algumas pequenas alterações nesta versão. Este artigo foi primeiramente publicado pela ACBH nas revistas De Regenboog nº 210 e 211 de out e set de 2016.
Esta história começou após um telefonema para o Núcleo Leiteiro da Lapa (município de Lapa, PR). Surgiu no meio da conversa o assunto Monte Alegre e assim combinamos um encontro com o casal Gertrud e Siebren Cnossen, no dia 14/06/2016 em Carambeí.
Fotos do acervo de Gertrud e Siebren Cnossen, que tem um grande interesse pela história da colônia Monte Alegre, Paraná. Na ocasião entregaram uma grande quantidade de fotografias da colônia para o acervo da Associação Cultural Brasil Holanda. Agradecemos muito ao casal por esta colaboração.
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